Na luta pelo Samu
A Luta

Na luta pelo Samu

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23/05/2018 08:30

Lápide SAMU Imagine o seguinte cenário: você e seu colega estão em uma sala, trabalhando durante horas sem parar, com muitas telas de computador à frente. Em cada uma delas, não param de surgir casos de urgência que demandam atendimento médico imediato. Cabe a vocês oferecer o primeiro suporte por telefone, e enviar socorro o mais rápido possível. Mesmo com toda a dedicação, no entanto, os dois sabem que não são capazes de dar conta da demanda. Faltam profissionais e a ajuda aos pacientes vai demorar mais do que o necessário. O cansaço e a angústia são aparentes. A narrativa podia ser parte de uma obra de ficção – antes fosse. Infelizmente, esse quadro caótico é real e se repete quase todos os dias na Central de Regulação do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) Estadual, onde médicos reguladores se desdobram e vão além do limite, mas sofrem com o descaso da gestão em suprir a falta de profissionais.

Desmonte em curso

Desde 2015, a regulação vem passando por um desmonte. O quadro de dificuldades já levou 40 médicos a pedirem exoneração. Atualmente há apenas 28 reguladores.O ideal conforme define a portaria nº 1.010/2012, seriam 70 profissionais para atender uma área de abrangência com sete milhões de gaúchos. “Estes números são uma temeridade. Médicos e população ficam expostos a um sistema fadado a comprometer a vida das pessoas”, avalia o presidente do Simers, Paulo de Argollo Mendes. Ao invés de obrigar os gestores a cumprir as normas, elas são revogadas. Um descompasso que deixa evidente a maneira como se trata a saúde da população. Estresse, ansiedade e frustração são apenas algumas sensações presentes no dia a dia dosmédicos que atuam na Central de Regulação do Samu Estadual. Por conta da falta de pessoal, inúmeros plantões são cobertos por apenas dois ou até mesmo um regulador. A portaria que rege o assunto prevê, no entanto, que pelo menos 12 reguladores devem estar presentes na sala de regulação durante o dia e mais dez à noite. O médico regulador Alberto Zabaleta, que atua no Samu há mais de cinco anos, classifica a situação como caótica. “Muitas vezes, trabalhamos sozinhos, mas os casos não param de chegar à tela e muitos você não consegue nem atender. Quem diz que o número de profissionais é suficiente nunca sentou em uma mesa de regulação. É algo para se desesperar", afirma. Estima-se que o tempo de atendimento, com o número insuficiente de profissionais, seja de 40 minutos a uma hora. Mas os problemas não param poraí. Como se não bastasse a pressão inerente à sobrecarga, os médicos têm de lidar com a incerteza sobre quando irão trabalhar As escalas de plantão são publicadas tardiamente. Isso sem falar da falta de leitos nas instituições de referência, um quadro crônico e que aumenta a responsabilidade do profissional que atua na regulação.

Reguladores sob pressão

Diante de um cenário como esse, não é difícil entender por que muitos dos profissionais são afastados das atividades por problemas de saúde. Zabaleta, que também atua em hospital e consultório, relata que nada se compara ao estresse e à ansiedade de atuar como regulador: se o ambiente já é de pressão no dia a dia, ela se multiplica com a falta de condições. “Sentimos a frustração e o estresse psicológico por escutar de um familiar que, se o paciente falecer, a culpa será nossa por não enviar ambulância em tempo”, desabafa Zabaleta. Em diversas ocasiões, médicos como ele se veem obrigados a orientar que as pessoas procurem a unidade de saúde mais próxima.

Simers em ação

Ao longo dos últimos anos, o Simers tem lutado pela melhoria das condições de trabalho no Samu e, consequentemente, pela qualidade do serviço oferecido à população. Uma das propostas apresentadas foi a abertura de um concurso público interno para a contratação de mais médicos. Entretanto, a medida vem sendo sistematicamente adiada – e não há previsão de novo processo seletivo. Em 2018, o Simers apresentou dossiês aos Ministério Público Federal e Estadual, denunciando os graves problemas do Samu. Argollo ressalta que são necessárias ações imediatas para resolver o problema, que afeta todo o Rio Grande do Sul. “Estamos falando de vidas em risco, de médicos que estão atendendo além do limite Não é possível esperar mais”, conclui.

Histórico do desmonte

2004: Em 31 de dezembro, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) cria a Central de Regulação do Samu Estadual. Hoje, apenas os municípios de Porto Alegre, Bagé, Pelotas e Caxias do Sul possuem regulação própria. 2012: Ministério da Saúde publica a portaria nº 1.010, que redefine as diretrizes para implantação do Samu. 2014: Até 2014, a contratação era emergencial e havia 53 reguladores. No mesmo ano, foi aberto concurso público que incluía70 vagas para médicos reguladores. Todos os aprovados foram chamados e assumiram 68 médicos. 2015: O desmonte se intensifica, causando problemas de gestão. 2018: Após sucessivos pedidos de exoneração ao longo dos tempos, restam apenas 28 médicos reguladores.  
Tags: Central de Regulação do Samu Estadual Samu estadual

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