As brasileiras são líderes em doação de leite materno, segundo estudo publicado em março pela revista britânica The Lancet. A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS) reconheceu as políticas adotadas no país desde os anos 1980, que foram detalhadas na pesquisa. Entre as medidas responsáveis pelo bom resultado estão a adoção da licença-maternidade de até seis meses, regulamentação da lei da amamentação e incentivo a prática.
De acordo com o estudo, o Brasil possui 72,9% dos sistemas de armazenamento de leite do mundo. São 292 unidades no total, sendo que 213 estão em território nacional. As outras estão localizadas em 21 países nas Américas, África e Europa. O Ministério da Saúde informou que a rede brasileira de bancos de leite recebeu um investimento de R$ 3,2 milhões nos últimos quatro anos.
Entre 2008 e 2014, foram coletados 1,1 milhão de litros de leite. Neste período, de cada dez doadoras, nove foram brasileiras. O estudo também verificou que as brasileiras amamentam mais que as britânicas, americanas e chinesas. A taxa de amamentação exclusiva para bebês até seis meses no Brasil é o dobro das constatadas nesses países. Dado que nem sempre se mantém, pois a realidade dos bancos de leite de Porto Alegre, por exemplo, indica que há necessidade de doações neste momento.
Benefícios para o bebê e para a mãe
A Organização Mundial da Saúde e a Sociedade Brasileira de Pediatria recomendam que a criança seja amamentada exclusivamente até o sexto mês. Após a introdução de alimentos complementares, a amamentação deve ser mantida até os dois anos ou mais. Segundo a UNICEF, se todos os bebês fossem exclusivamente amamentados durante os seis primeiros meses e continuassem a mamar até os dois anos, quase um milhão e 300 mil crianças poderiam ser salvas todos os anos.
O médico pediatra e consultor internacional em aleitamento materno pelo
International Board of Lactation Consultant Examiners (IBLCE), Roberto Issler, explica que até os seis meses, os bebês em amamentação exclusiva não precisam receber nenhum outro tipo de alimento ou bebida. “O leite materno tem tudo que o bebê precisa na proporção adequada para proporcionar um crescimento ideal”. Issler ainda ressalta que estudos recentes mostram que bebês amamentados tem um quociente de inteligência maior e melhor renda na idade adulta do que bebês não amamentados.
A amamentação também proporciona melhor desenvolvimento orofacial, contato íntimo com a mãe, protege de infecções como pneumonia, otite e diarreia. A longo prazo, crianças amamentadas possuem menos chance de apresentar obesidade, diabetes e alergias. “Bebês amamentados dificilmente ficam doentes”, enfatiza o especialista.
Para as mães que amamentam seus filhos, também existem benefícios. Esse ato reforça o vínculo entre os dois e diminui o risco da mulher desenvolver câncer de mama e de ovário. “O alimento está sempre pronto, na temperatura ideal, por isso mais prático e econômico. Amamentar é muito mais barato”, reforça o médico.
Existem mitos de que mulheres que estão amamentando não podem comer alimentos temperados, chocolate ou tomar chimarrão. “Na verdade, não existe nenhuma restrição absoluta de qualquer alimento durante a amamentação. Pequenas quantidades de chá, chocolate e café podem ser consumidas”, esclarece o pediatra. As mães não devem usar drogas e consumir bebidas alcoólicas. “Mães que amamentam não devem fumar, tanto pela passagem pelo leite materno de metabolitos da nicotina quanto pelo efeito ambiental da fumaça do cigarro e maior risco de infecção respiratória”.
Quanto ao uso de medicamentos, Issler explica que os mais utilizados no dia a dia, a nível ambulatorial, não são contraindicados na amamentação, como anti-inflamatórios hormonais e não hormonais, antibióticos, antialérgicos, anticonvulsivantes, analgésicos e sedativos. “Na dúvida, consulte seu médico pediatra ou ginecologista-obstetra”, orienta o profissional.
É importante as mães estarem atentas ao uso de chupetas e mamadeiras pelos bebês, pois é contraindicado na amamentação. “No início do processo, bicos e mamadeiras podem atrapalhar e confundir o bebê, já que a mecânica e a musculatura utilizadas durante a amamentação são diferentes daquelas que o bebê usa para sugar a chupeta ou mamadeira”, diz o médico que também pontua o risco de contaminação desses utensílios, se houver técnicas inadequadas e insuficientes de higienização.
Leite doado ajuda bebês prematuros
No Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV), localizado na capital gaúcha, o Banco de Leite Humano tem capacidade para processar 100 litros de leite por mês. O leite doado é destinado aos bebês internados na neonatologia do hospital, cujas mães não podem amamentá-los ou não produzem quantidade suficiente de leite. “O leite coletado é direcionado aos bebês prematuros. Seria doado para os outros também se houvesse excedente de leite”, explica a coordenadora do local, a enfermeira Maria Inês Voigt Vigne.
Além de não ter excesso de leite, os estoques do hospital estão baixos. Segundo Maria Inês, a falta de doação oscila durante o ano. “Muitas mulheres param de doar porque não têm mais produção. Essa queda também ocorre devido ao desconhecimento do serviço e locais que coletam leite”, explica. Mães que estiverem amamentando podem ser doadoras desde que não tenham problemas de saúde e não estejam tomando medicação. O leite pode ser coletado no Banco de Leite ou em casa. Em seguida, é pasteurizado e analisado pelo laboratório e, somente após esse processo, será doado para os bebês.