“É preciso empoderar população na luta contra Aedes”, diz médico comunitário
A melhor forma de combater a dengue, a febre chukungunya e o zika – responsável pela epidemia nacional de microcefalia – é não deixar o Aedes aegypti, mosquito vetor das doenças, nascer. O governo federal convocou um esforço nacional para...
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28/01/2016 12:32
A melhor forma de combater a dengue, a febre chukungunya e o zika – responsável pela epidemia nacional de microcefalia – é não deixar o Aedes aegypti, mosquito vetor das doenças, nascer. O governo federal convocou um esforço nacional para que todas as casas do país sejam visitadas a fim de eliminar criadouros. As visitas domiciliares são essenciais para o combate ao vetor, mas não são novidade para quem exerce a Medicina de Família e Comunidade no dia a dia.
No contato constante com a população, médicos e agentes de saúde desenvolvem ações com os moradores, relativas aos cuidados permanentes para evitar depósitos de água parada nas residências. Trabalhando na Estratégia de Saúde da Família Morro da Cruz, zona leste de Porto Alegre, desde sua residência na área, Fernando da Mota conhece bem a população e a realidade da comunidade onde atua. Único médico da unidade que conta com duas equipes de agentes de saúde, ele se desdobra para atender os pacientes da região e sabe como a prevenção de doenças na atenção básica é a melhor forma de evitar as filas por consultas e complicações futuras. Inclusive, que a prevenção de focos do mosquito é fator para evitar a proliferação das doenças que ele transmite e a má-formação fetal que pode ocorrer quando grávidas contraem zika.
População atenta
Faz parte da rotina dos agentes de sua ESF munir pacientes e acompanhantes com informações cruciais para sua saúde, desde a sala de espera. O reforço é feito pelo médico nas consultas e nas visitas residenciais. No caso do combate ao mosquito, o esforço da equipe já mostra resultados. Nas últimas semanas, Fernando atendeu duas moradoras efetivamente preocupadas em combater o Aedes. “Uma chegou à unidade com um mosquito no vidro, preocupada se seria Aedes aegypti. Era parecido, mas não era. Mostramos as características do Aedes e incentivamos a seguir alerta quanto à presença do mosquito”, relata.
Em outro caso, parecia apenas um atendimento a uma lesão de ombro. Mas Fernando acredita que é papel do médico comunitário buscar informações por trás do motivo da consulta, ou como ele diz “furungar”. Assim, descobriu que sua paciente se machucou ao esvaziar uma bacia, após perceber que ela recebia água de uma calha onde encontrara larvas de inseto. “Aí já notificamos o agente de endemias para fazer uma visita ao local e checar.” As mães que fazem pré-natal na unidade também se mostram preocupadas e levam suas dúvidas para as equipes. “Elas perguntam, e eu, os enfermeiros ou técnicos que as atendem temos que fazer essa troca, questionando sobre qualquer alteração e levando informações. Por isso, estamos sempre em educação continuada.”
Infelizmente, o contato do médico com o tema não se resumiu em orientar a comunidade. Recentemente, ele também atendeu um menino de 12 anos, a primeira suspeita de dengue na ESF. “Ele apresentava os sintomas clássicos. Contou que ia viajar para o interior e orientamos a não ir. Notificamos a Vigilância Sanitária, é preciso investigar e isolar o paciente, para evitar que ele seja picado e o mosquito se torne hospedeiro do vírus. Agora, aguardo informações se foi confirmada dengue ou não.”
Fernando reclama da falta de interligação de informações da rede de saúde. “Não posso saber se alguém da comunidade teve dengue se não tiver passado pela ESF. O Cartão do SUS traz informações apenas dos atendimentos realizados aqui. Então, se um morador da comunidade for diagnosticado em outro serviço, não tenho como saber”, lamenta. “O mundo ideal seria que tivéssemos o histórico completo dos pacientes”, diz, lembrando que um segundo contágio de dengue pode ser mais violento que o primeiro, já que normalmente se dá por um subtipo diferente da doença. Por isso, é tão importante questionar o paciente além do sintoma que o leva ao atendimento.
Empoderar com saber
“Prevenção de doença, promoção da saúde, vigilância sanitária não são funções exclusivas dos médicos, nem apenas das equipes de saúde. É importante empoderar a população de conhecimento para que ela seja um agente da própria saúde e qualidade de vida”, acredita Fernando. Ele alerta que esse dispersar do saber é fundamental neste momento de epidemia nacional que requer o combate agressivo ao Aedes aegypti, mas também no dia a dia, na luta contra doenças silenciosas. “O início do dispersar do saber é um incumbência nossa.”
“Tenho a percepção que o paciente com dengue ou chikungunya não vai deixar de procurar o serviço de saúde. Ele vai ter dor, vai se assustar e buscar o médico. Mas as doenças crônicas são as que mais matam. Aqui na comunidade, temos alta prevalência de obesidade, diabetes, hipertensão, que geram complicações graves e que podem ser evitadas com a mudança de hábitos”, contrapõe. O ponto de vista do médico comunitário, portanto, é global e diferenciado, e sua atuação é sempre no sentido de evitar que os problemas surjam ou cresçam sem receber os devidos cuidados e encaminhamentos. “Não podemos quebrar esse vínculo com a comunidade, o paciente tem que entender os riscos, os sintomas e, quando é uma questão de hábitos de vida, levar as informações para casa, para a família.”
“Como convencer as pessoas a evitar água parada, se elas desconhecem o risco? Não basta dizer para limpar o quintal, mas explicar que é ali que nasce o Aedes aegypti, que ele é vetor de doenças graves e que elas podem chegar à comunidade e se disseminar rapidamente graças à presença do mosquito”, diz Fernando, pontuando que o conhecimento pode ser um fator contra a resistência de alguns moradores às visitas de agentes. É uma corrente de cidadania. “A pessoa recebe a informação e compartilha em casa, com amigos e colegas. E mesmo que atinja apenas um, já valeu a pena. Fazemos um trabalho de formiguinha.”
Faça sua parte
Entre as principais recomendações no combate ao Aedes aegypti, estão:
- Tampar caixas d’água e recipientes que acumulem água;
- Guardar garrafas vazias viradas para baixo e pneus sob abrigos;
- Não acumular água nos pratos de vasos de plantas e enchê-los com areia;
- Manter desentupidos ralos, canos, calhas, toldos e marquises;
- Manter lixeiras fechadas;
- Manter piscinas tratadas o ano inteiro.
Mulheres grávidas, especialmente no primeiro trimestre, devem ter cuidados redobrados:
- Evitar locais com proliferação de mosquitos;
- Evitar viagens a regiões com alto contágio de zika;
- Utilizar roupas longas, que cubram braços e pernas;
- Fazer uso de repelentes indicados a gestantes, como os à base de DEET, em concentração de 10 a 30%.
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