Entre a medicina, o cartum e a charge, Ronaldo Cunha desenvolve uma linguagem peculiar para criticar as dificuldades da área da saúde – como profissional e como cidadão
Cada toque do lápis no papel dura não mais do que uma fração de segundo. Em traços rápidos e certeiros, as linhas se cruzam. Antes que você possa se questionar do que se trata, o desenho já ganhou forma e sentido. Sentado em frente à prancheta, em um quarto que é também refúgio, o cirurgião geral sai de cena e abre espaço para o cartunista. Mas as duas faces de Ronaldo Cunha não se anulam. Em ambas há a marca da precisão – seja para conduzir o bisturi ou a caneta – e o sorriso fácil no rosto. Receita de quem aprendeu a levar a vida no seu próprio tempo, com a motivação de fazer aquilo que gosta. “Quando algo é feito com prazer, tudo fica mais fácil. Todo mundo deveria experimentar essa sensação diariamente”, recomenda. Formado na primeira turma da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em 1976, Ronaldo trazia da infância o desejo de ser médico. Nunca pensou que pudesse ser outra coisa na vida. Até que se tornou um dos mais respeitados cartunistas e chargistas do Brasil. Hoje, o que era passatempo se transformou em segunda profissão e também um remédio diário contra a tristeza e o estresse – prescrição certeira, sem contraindicações. Além de ilustrarem a revista Vox Medica, suas charges já estamparam alguns dos principais jornais do Estado. Só no jornal O Pioneiro, de Caxias do Sul, foram mais de seis mil publicações. Cada uma delas está cuidadosamente armazenada em seu computador pessoal; outras tantas estão impressas e guardadas em caixas. Também foram inúmeras as colaborações para o jornal Zero Hora, desde que o chargista era, ainda, um estudante de Medicina. “Desde a infância, gostei de desenhar. Minha mãe guardou alguns dos trabalhos da época em que eu tinha cinco ou seis anos e me mostrou quando eu já era adulto. Eu mesmo me espantei com a qualidade!”, detalha Ronaldo. O primeiro grande incentivo, lembra ele, veio da escola. Durante uma prova livre de desenho, ele retratou a beleza do Pão de Açúcar com toda a riqueza de detalhes que foi capaz de evidenciar. O reconhecimento veio em seguida: sua nota não foi dez, mas 11. “Na prova seguinte, eu caprichei ainda mais e ganhei 12”, conta, entre risadas. Dos desenhos da escola para o cartum, a transição foi rápida como um rabisco. Quando surgiu a oportunidade de fazer charges, de outro modo, a primeira reação foi de incerteza. O primeiro, explica ele, funciona quase como uma linguagem universal, capaz de ser compreendida por qualquer pessoa, mesmo passados anos de sua produção. O segundo, por outro lado, carrega um tipo de humor mais vinculado a um contexto específico, com validade limitada. Mesmo assim, aceitou o desafio. Hoje, Ronaldo se divide entre os dois estilos - embora não esconda a preferência pelo lado cartunista.Às vezes, estou andando na rua e, de repente, vem o desenho pronto na minha cabeça.
Sou cidadão comum e médico, então vejo não só as necessidades do paciente como também as dificuldades enfrentadas por aqueles que atuam na área.
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