As marcas do bullying
A Luta

As marcas do bullying

“Colocavam muitos apelidos em mim e faziam caricaturas por causa da minha altura. As piadas maldosas permaneceram por muito tempo, todos os dias na escola, até chegar ao ponto em que não aguentava mais. Me senti totalmente diminuído, com baixa...

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29/09/2016 17:48

bullying1 “Colocavam muitos apelidos em mim e faziam caricaturas por causa da minha altura. As piadas maldosas permaneceram por muito tempo, todos os dias na escola, até chegar ao ponto em que não aguentava mais. Me senti totalmente diminuído, com baixa autoestima, inseguro em muitos momentos, inclusive perto das garotas, e mais tímido que o normal. Cheguei a chorar e procurei ajuda médica”. O depoimento do turismólogo Fernando , 31 anos, é mais comum do que pensamos. Tudo o que aconteceu com ele é consequência do bullying, prática que assombra muitas pessoas, principalmente crianças e adolescentes, em qualquer parte do mundo. Considerado caso de saúde pública, Bullying é um termo originário da palavra em inglês Bully, que significa valentão. Tem como característica qualquer ato de violência psicológica ou física praticada por uma pessoa ou mais, intencionalmente, de maneira consecutiva, causando angustia, medo e humilhação às vítimas. “Comecei a sofrer na 4ª série, ainda no interior. Quando vim morar em Porto Alegre, começou a ficar mais pesado. Faziam muitas piadas de mau gosto por conta de minha fisionomia. Era um sofrimento diário. Eu me achava a pior pessoa do mundo. Muitas vezes chorei em casa e na escola.”, conta Fernando. Escutar piadas e brincadeiras maldosas todos os dias, também fez parte da vida do estudante de jornalismo Vinícius Velho, 29 anos. “Sempre fui muito magro, então, desde a segunda série, as outras crianças me chamavam de palito, vassoura, cabide, inúmeros apelidos. No início não me importava tanto, levava na brincadeira, mas depois, de tanto fazerem piadas, comecei a ficar mal, triste e sem confiança alguma.”, relata. A última pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre a saúde do estudante brasileiro, aponta que 20% dos alunos do nono ano do ensino fundamental já praticaram bullying. O estudo mostra que as meninas são menos provocativas que os meninos. São 15,6% contra 24,2%. Os dados do IBGE também revelam que o bullying é mais frequente em escolas particulares (21,2%) do que em escolas da rede pública (19,5%). E sobre os motivos que levam as agressões com os colegas, 51% não souberam responder. Os outros, afirmaram que as ofensas seriam por causa da aparência. Os alunos que já sofreram por causa disso somam 7,4%. Normalmente, as vítimas de bullying sentem dificuldade de contar para os familiares, pois acabam se sentindo envergonhados com os constantes abusos. “A identificação nem sempre é fácil, porque se trata de um assunto constrangedor, ficam com vergonha de não conseguir lidar com a situação, com medo das consequências e muitas vezes culpadas”, explica o médico psiquiatra, especialista em infância e adolescência, Paulo de Tarso Fontes Neto. Os sintomas não são tão fáceis de serem identificados pelos pais, porém algumas mudanças comportamentais podem indicar o bullying. Tentar arranjar desculpas para não ir à aula, além de lesões na pele, é alguns desses sinais. “Dentre eles destacam-se: recusa em ir para o colégio, dor de cabeça e de barriga frequente, pedidos de mudança de rota para ir e retornar da escola; comportamento mais tenso e choroso principalmente na hora de ir ou ao voltar da escola; hematomas, perda do material e dificuldades na hora de dormir”, afirma Fontes. Entretanto, muitos pais não conseguem ter essa conversa para detectar alguns sintomas em tempo. Foi o que aconteceu com o garoto norte- americano Daniel Fitzpatrick, 13 anos, que no mês passado cometeu suicídio. O menino era alvo de insultos pelos colegas de classe, que atiravam objetos nele e o xingavam. A criança não aguentou as provocações diárias e tirou a própria vida, sem antes deixar uma carta aos pais relatando a situação que estava enfrentando. Por episódios trágicos como esse, o médico explica que a proximidade diária com os filhos é fundamental. “O hábito de conversar com os filhos, de reservar um tempo legítimo e interessado sobre os acontecimentos da vida, traz a segurança para a criança ou adolescente falar de seu mundo. A vítima de bullying procura uma pessoa que confie para dividir a situação que esta vivendo”. No caso de Fernando, seus pais perceberam algo estranho quando ele começou a não querer ir à escola. “Eu estava com medo e bastante inseguro. Inventava desculpas para não ir à aula. Não queria mais sofrer com todas aquelas piadas. Então, vieram conversar comigo e eu contei tudo”, relata. Poucos sentem coragem de contar aos pais sobre as ofensas sofridas. Velho foi um deles. O estudante afirma que nunca teve esse problema. “Sempre tive diálogo aberto com meus pais. Até por isso, nunca tive vergonha de contar a eles”. Um passo importante e essencial para o psiquiatra é procurar a escola. Os pais da vítima devem informar a instituição e manter o controle para não cobrarem diretamente da família do aluno agressor. “A escola deve ser informada imediatamente para que as providências sejam tomadas. A identificação das pessoas envolvidas, o encorajamento aos pais da vítima de não entrarem em contato imediatamente com os pais do agressor, impulsivamente sem um planejamento com a escola ajudam muito na resolução da situação”, orienta Fontes. O Tratamento envolve orientação e medicamentos O bullying pode acarretar outros problemas de saúde como fobias e depressão. Geralmente, as vítimas ficam tão abaladas e abatidas, necessitando ajuda de um especialista para recuperar a confiança. O tratamento é feito com um psiquiatra que procura entender os sentimentos e analisar como o indivíduo pode lidar diante das ofensas. “Após a avaliação da vitima, assim como do agressor, em ambos procura-se identificar as consequências, os sentimentos envolvidos, o manejo destes sentimentos, as possibilidades diante das situações, as defesas utilizadas para enfrentar as situações e suas consequências”, diz Fontes. O psiquiatra ainda explica que dependendo do caso, é preciso receitar medicamentos. “As medicações são usadas quando comprovado a existência de um transtorno associado como: algum tipo de transtorno de ansiedade, depressão, algum transtorno primário sem tratamento”, completa. Tanto o turismólogo quanto o estudante de jornalismo, precisaram buscar auxilio médico para enfrentar a situação. “Fui ao psiquiatra e precisei tomar remédios para ansiedade e transtorno de toque, ambos gerados pelo bullying, porque não sabia o que ia acontecer no dia seguinte, se tudo ia melhorar ou as piadas seriam ainda mais fortes”, confidencia Fernando. Já o estudante estava ficando agressivo com os colegas, o que, primeiramente, o levou até ao médico. “Fui ao psiquiatra devido às brigas no colégio. Muitas delas foram geradas pelo bullying que eu sofria. As conversas com o especialista me ajudou bastante a encontrar meios para superar o problema”, conta Velho. O tratamento consiste em muito mais que apenas auxiliar o indivíduo a sanar o medo e reencontrar a confiança, mas sim uma abordagem integral para que a vítima não se torne um agressor no futuro. “A autoestima, a identificação de suas dificuldades e habilidades, o fortalecimento, o incremento a resiliência precisam e merecem atenção total, mas vale lembrar que a abordagem mais abrangente previne outra situação frequente na qual a vitima de bullying se torna um agressor”, ressalta o médico. *Fernando é um nome fictício para preservar a identidade da fonte.  
Tags: Bullying

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