A desigualdade social faz mal à saúde, aponta estudo publicado em fevereiro na revista médica britânica The Lancet. De acordo com a pesquisa, o risco de morrer antes dos 85 anos é 46% maior entre os mais pobres.
No texto, assinado por cerca de 30 especialistas de instituições como a Escola de Saúde Pública de Harvard e o King’s College de Londres, os autores enfatizam que as circunstâncias socioeconômicas deveriam ser definidas pelas estratégias locais e globais de saúde como determinantes para a morbidade e mortalidade prematura no mundo.
Doenças negligenciadas e seu combate
Na saúde, um dos reflexos provocados pela desigualdade social é a incidência das chamadas doenças negligenciadas. Causadas por parasitas ou agentes infecciosos e com tratamentos já conhecidos, apresentam maior ocorrência nos países em desenvolvimento e são consideradas endêmicas em populações de baixa renda.
Mas conforme explica a médica e pesquisadora da
Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz) Monica Kramer de Noronha Andrade, “além de apresentarem maior ocorrência em indivíduos em condições de pobreza, elas contribuem para a perpetuação do quadro de desigualdade, uma vez que representam uma grande barreira ao desenvolvimento dos países. Os motivos elencados para isto estão relacionados a deficiências na adoção de estratégias políticas de investimento na saúde, educação e inovação tecnológica”, explica.
No Brasil, os principais exemplos de doenças negligenciadas presentes são a dengue, doença de Chagas, esquistossomose, hanseníase, leishmaniose, malária e tuberculose. Para Monica, o combate a elas passa por políticas de governo relacionadas à doença em si, às condições sociais e ainda à prevenção.
Além disso, a médica defende a importância do envolvimento da sociedade civil e do incentivo a institutos de pesquisa que atuem em rede com as indústrias farmacêuticas. O objetivo é buscar opções de diagnóstico e tratamento mais efetivos, além do acesso aos medicamentos disponíveis.
Caso da tuberculose preocupa
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 10,4 milhões de pessoas tiveram
tuberculose em 2015 e mais de um milhão morreram em decorrência da doença. Para Monica, os números mostram por que a enfermidade ainda preocupa tanto, inclusive no Brasil.
De acordo com dados de boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde neste ano, o coeficiente de mortalidade da tuberculose teve uma redução de 15,4% entre 2006 e 2015. Mesmo assim, embora seja curável e com tratamento eficaz e gratuito, no penúltimo ano foram registrados 4.543 óbitos por conta da doença em território nacional.
Os dados revelam ainda que, somente em 2016, foram diagnosticados e registrados 79.605 casos de tuberculose. Do total, 83,9% representam novas ocorrências e 16,1% delas estão relacionadas à necessidade de retratamento – taxa considerada alta.
Também segundo o boletim, no Rio Grande do Sul a incidência da doença é de 37,5 casos para cada 100 mil habitantes, a sexta mais alta entre os estados brasileiros. Em Porto Alegre, os números são ainda mais preocupantes: a cidade ocupa a quarta colocação entre as capitais brasileiras, com um índice de 80,4 tuberculosos para cada 100 mil habitantes.
Através de um Plano Nacional divulgado em junho, o Ministério da Saúde se compromete em acabar com a doença como problema de saúde pública até 2035. O desafio passa pela intensificação nas pesquisas e também pelo aumento nos investimentos feitos na área, hoje insuficientes.