Esquizofrenia: se descoberta com antecedência tratamento pode desacelerar o processo de envelhecimento provocado pela doença
A Luta

Esquizofrenia: se descoberta com antecedência tratamento pode desacelerar o processo de envelhecimento provocado pela doença

Atingindo cerca de 1% da população, a esquizofrenia é uma doença mental crônica ainda pouco conhecida e sujeita a muita desinformação. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), ela está entre as dez principais causas de incapacitação em...

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24/04/2017 14:01

esquizofrenia Atingindo cerca de 1% da população, a esquizofrenia é uma doença mental crônica ainda pouco conhecida e sujeita a muita desinformação. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), ela está entre as dez principais causas de incapacitação em todo o mundo, principalmente por ser grave e acometer uma parcela significativa das pessoas em idade produtiva. Além dos sintomas que afetam o comportamento e a capacidade para o trabalho, a esquizofrenia também é caracterizada por achados compatíveis com um processo de envelhecimento acelerado. Estima-se que a expectativa de vida nesta população seja de cerca de 20 anos a menos que a da população em geral. No entanto, sabe-se que o tratamento precoce e contínuo da esquizofrenia pode desacelerar esse processo de envelhecimento. Para isto, é muito importante que as famílias estejam atentas a possíveis sintomas, vençam o preconceito e estigma que cercam a doença e procurem ajuda especializada. De forma inovadora, um estudo realizado no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) mostrou que a evolução da esquizofrenia colabora para o processo de envelhecimento precoce. Para chegar a esta conclusão, os pesquisadores avaliaram os achados biológicos, cerebrais e de testes cognitivos de 112 voluntários. O estudo reforça que o tratamento continuado, desde o início da doença, pode prevenir ou desacelerar a evolução para um processo demencial. “O individuo com esquizofrenia, principalmente aqueles que não recebem tratamento adequado, tendem a ter outras doenças como diabetes, pressão alta que acontecem em pessoas bem mais velhas. E tendem a morrer mais cedo, 20 anos antes do que a média da população geral. Isso tem sido relacionado principalmente à falta de tratamento adequado,” destaca a coordenadora da pesquisa Clarissa Severino Gama, professora do Serviço de Psiquiatria do Hospital de Clínicas. Para Clarissa, muitos problemas mentais passam despercebidos ou são estigmatizados pelas famílias. “Como a esquizofrenia geralmente se manifesta na adolescência, as mudanças de comportamento podem parecer algo natural dessa fase da vida. Por isso é muito importante que a família esteja atenta a problemas escolares e de relacionamento ou a sintomas como delírios e alucinações. À medida que evolui, a doença se torna muito incapacitante e o tratamento, quando iniciado na adolescência, tem melhores resultados”. Há fatores de risco em toda a população para o desenvolvimento da esquizofrenia como pessoas que tiveram infecções durante a gestação e eventos perinatais. Já na adolescência o uso da maconha implica no aparecimento da doença. “Em pesquisa recente portadores de esquizofrenia relataram usar maconha na adolescência. Com isso houve a percepção de que tem chance maior de desenvolver a patologia a pessoa que fuma maconha”. De acordo com a pesquisadora, o manejo da esquizofrenia visa o controle dos sintomas e a reintegração do paciente na sociedade, já que a doença não tem cura. A presidente da ONG Associação Gaúcha de Familiares de Pacientes Esquizofrênicos (AGAFAPE), localizada no Centro de Porto Alegre, Marília Coelho Cruz, mostra como é possível conviver em harmonia com a doença. Fundada há 25 anos por um grupo de mães com filhos que usavam uma medicação nova na época para esquizofrenia vinda da Suíça, a ONG tem como objetivo unir pessoas portadoras da doença e seus familiares para a participação de palestras, reuniões e apoio. “Aqui o espaço é do esquizofrênico, serve para tirar eles da inanição”, destaca a presidente.“ Mãe de Leonardo hoje com 50 anos, Marília convive com a doença do filho há 28 anos. “Jamais escondi o meu filho. Ele sempre esteve presente em todos os lugares em que eu estive e isso nos ajudou muito a enfrentar a doença. Por isso nos reunimos na ONG, porque a pessoa tem que procurar sempre o seu igual. A doença não diminui de intensidade porque eu me agreguei a ela, mas nos ajuda a viver com dignidade com uma doença tão terrível como essa”. Desde pequeno Leonardo foi tratado e cuidado com toda a atenção que uma criança deveria ter. Nunca apresentou algum sintoma diferente. Descrito como um menino calmo, educado e muito inteligente o sonho desde garoto era trabalhar na Varig. “Ele tinha muita facilidade para aprender, mas dificuldades motoras. Enquanto estava na escola, quando começou apresentar as dificuldades motoras o matriculei na natação. Na época me disseram que ele tinha capacidade intelectual, mas a motora não era boa,” descreve Marília. O primeiro surto “Os colegas de trabalho mexiam com ele, brincavam e quando ele ficava muito deprimido com o passar do tempo descobri que ele ia para o final da pista e chorar. Foi quando no trabalho, um dia, o meu marido trouxe ele para casa estressado, contando que o Leonardo estava ouvindo vozes. Os médicos da empresa encaminharam ele para uma a clínica em Porto Alegre. A impressão é que o chão se abriu. Foi de repente, ele estava trabalhando, dirigia, viajava, e do nada ele surtou. Leonardo não sabia o que estava acontecendo com ele e muito menos nós. Penamos por seis anos. Ele indo para o médico, hospital e nada dava resultado. Ele ouvia vozes e isso fazia ele se irritar porque ele não sabia de onde vinham nem o que eram. As vozes sempre o depreciavam, mas jamais ele ouviu dizer para se matar. No meu ver a pior coisa dessa doença é que eles não ficam totalmente alienados. São momentos e, têm momentos de muita lucidez e é aí que eles sabem o que eles queriam, o sonho deles, o que eles perderam e o que eles são. Essa é a pior coisa da esquizofrenia e tu fica impotente porque não pode fazer nada. Agora eu pinto e bordo com as vozes. As vozes dizem “tu é louco, tu não vai atingir teus objetivos, tu não vai ser feliz”. Digo pra ele “tu sabe que não são as vozes que estão te falando. É o íntimo do Leonardo que pensa isso de ti mesmo. Então a doença é essa, esse teu pensamento íntimo que reflete nas vozes que tu ouve porque não existem vozes nem de pessoa de fora nem de dentro da tua cabeça.” A AGAFAPE funciona todas as tardes, de segunda a sexta-feira, na Galeria Malcon, Rua dos Andradas, 1560, sala 612. “O grupo é diferenciado porque eles são companheiros. Sabem das dificuldades que têm. Aqui eles treinam para conviver com as pessoas lá na rua. Tenho uma doença, vou ser tratado diferente, mas posso me inserir na comunidade. O Leonardo jamais sentiu preconceito porque desde o primeiro momento ele soube que tem esquizofrenia. E isso facilitou a nossa vida. Ele é dócil. Aceita o tratamento”, conclui Marília. 20170407_161805_1492003024305
Tags: Esquizofrenia; Saúde mental

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