O AUMENTO NA DISSEMINAÇÃO DE NOTÍCIAS FALSAS, ESPECIALMENTE DIANTE DO CENÁRIO POLÍTICO VIVIDO NO BRASIL, EXIGE ATENÇÃO DOS USUÁRIOS
Em 2016, durante a campanha presidencial dos Estados Unidos, o mundo foi surpreendido com uma notícia de alto impacto: o Papa Francisco, posicionando-se “como um cidadão preocupado com o mundo”, teria declarado apoio à candidatura de Donald Trump. Foi uma bomba. Só no Facebook, a informação gerou 961 mil interações entre comentários, curtidas e compartilhamentos, segundo um levantamento do Buzzfeed News. Havia apenas um detalhe: a notícia era falsa – havia se originado no site satírico WTOE 5 News.
As notícias falsas, também chamadas “fake news”, tornaram-se parte do dia a dia de grande parte da população, especialmente aquela que frequenta as redes sociais. E o pior: há evidências de que essa rede de mentiras influencia decisivamente a opinião pública em temas fundamentais – do Brexit à imagem de líderes políticos. A eleição de Trump foi um exemplo. Recentemente, veio à tona a informação de que uma empresa britânica, chamada Cambridge Analytica, coletou e usou indevidamente os dados pessoais de milhões de usuários americanos do Facebook para beneficiar o candidato republicano. Foi o suficiente para reacender o debate: afinal, é possível confiar nas notícias que circulam nas redes sociais?
Entenda o caso da Cambridge Analytica
Fundada em 2013, a Cambridge Analytica é conhecida por seus serviços para a campanha de Trump e pró-Brexit, no Reino Unido. Parte do trabalho consiste em criar perfis que representem o público pretendido, com base em traços de personalidade. Ou seja, a partir do recolhimento de informações pessoais, o objetivo é mapear interesses em comum e utilizá-los para direcionar e manipular a informação. A empresa está na mira das autoridades sob a acusação de que o modelo tem sido desenvolvido a partir de dados recolhidos ilicitamente de 87 milhões de usuários do Facebook (entre eles, 443 mil brasileiros).
Fake news na política
Ano eleitoral, intensa polarização política, discussões exaltadas. Para Bárbara Libório, repórter da Aos Fatos – iniciativa especializada na checagem de informações –, o cenário vivido no Brasil favorece a disseminação de notícias falsas. “Elas são utilizadas como munição no debate, para provar um ponto de vista, mas sem a preocupação em verificar se são verdadeiras”, explica.
Em pesquisa realizada pela Aos Fatos no início deste ano, 50,8% dos entrevistados admitiram, inclusive, já terem tomado decisões baseadas em notícias que descobriram ser inverídicas. “Aí podemos estar falando de tomar ou não a vacina da febre amarela, mas também pode ser o voto em uma eleição”, destacou. O exemplo dá o peso de como uma simples informação falsa pode ter impacto decisivo.
Não por acaso, têm se multiplicado iniciativas do chamado fact-checking. O objetivo é analisar a veracidade das informações que circulam. Para Bárbara, a criação dessas instâncias de checagem tem gerado reflexão entre os próprios políticos. “Esperamos que eles se sintam cada vez mais constrangidos em usar dados falsos ou distorcidos”, reforça.
Difusão é mais rápida
Estudo realizado pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts e publicado na revista científica Science mostra que histórias falsas têm 70% mais probabilidade de compartilhamento no Twitter, rede social utilizada para a análise. Para chegar à conclusão, foram verificados 126 mil rumores, compartilhados por cerca de três milhões de usuários desde 2006 até o ano passado.
Culpa dos bots?
O estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts trouxe, ainda, outro dado curioso sobre as fake news: os números mais expressivos de compartilhamento são resultado da interação de usuários reais, e não uma consequência dos “bots” (ou robôs), como são conhecidos os softwares criados para simular ações humanas de maneira padrão e repetida.
Bárbara entende que o robô é capaz de aumentar o alcance de uma notícia e garantir que ela chegue a locais que não atingiria naturalmente. Por outro lado, ele não passa a confiabilidade da informação compartilhada por um amigo - que também pode ser, no fim de contas, fake news.
Como identificar
E você, sabe dizer se uma notícia é verdadeira ou falsa? Na dúvida, vale ligar o sinal de alerta e tomar alguns cuidados básicos de checagem:
Chamadas sensacionalistas
Para atrair a atenção do leitor, as notícias falsas costumam trazer títulos sensacionalistas, que induzem à curiosidade e ao clique. Em outros casos, a chamada não condiz com as informações descritas no corpo do texto.
Data da publicação
Às vezes, a notícia não é propriamente falsa, mas antiga. Ou seja, talvez aquela declaração bombástica que a manchete sugere tenha sido dita em outro contexto, muitos anos antes. Por isso, verifique sempre a data da publicação.
Fontes da notícia
Quem disse isso? A matéria cita fontes? Elas são confiáveis? Muitas vezes, toda a informação é construída com base em um “estudo revolucionário”, realizado sem critérios científicos sérios, ou mesmo apenas com caráter opinativo. Na dúvida, prefira matérias que indicam o link do estudo.
Adjetivação
Notícias falsas costumam abusar dos adjetivos e de um discurso inflamado, diferente do padrão comum da imprensa.
Pesquisa no Google
Outra forma rápida de identificar uma notícia falsa é fazer uma pesquisa no Google e verificar se existem outros sites falando sobre o assunto. Há, inclusive, sites especializados em checar informações (como Boatos.org, Aos Fatos, Agência Lupa).
Endereço da página
Muitos sites que propagam notícias falsas adotam nomes semelhantes aos de veículos reconhecidos da imprensa, tentando se passar por eles. Na dúvida, busque o site original e compare.
A reportagem integra a edição 77 da Revista VOX Medica, do Simers.